larva 12

(…) Havia no amor de Cristo uma espécie de identificação abstrata, ou, pior ainda,

um ardor de dar sem nada tomar. Cristo não queria responder às expectativas de seus

discípulos, e mesmo assim não desejava conservar nada, nem sequer a parte inviolável

de si mesmo. Tinha algo de suicida. Lawrence escreve um romance, O homem que morreu,

pouco antes de seu texto sobre o Apocalipse: nele imagina Cristo ressuscitado

(“despregaram-me rápido demais”), porém também enjoado, dizendo “isso nunca mais”.

Reencontrado por Madalena, que deseja dar-lhe tudo, percebe no olhar da mulher um

pequeno clarão de triunfo, na voz um tom de triunfo em que se reconhece a si mesmo.

Ora, é o mesmo clarão, o mesmo tom presente entre aqueles que tomam sem dar. No

ardor de Cristo e na cupidez cristã, na religião do amor e na religião de poder, há

a mesma fatalidade: “Dei mais do que tomei, e também isso é miséria e vaidade. Não

passa, ainda, de uma outra morte… Agora ele sabia que o corpo ressuscita para dar

e para tomar, para tomar e para dar, sem cupidez”. (“Nietzsche e São Paulo, D. H.

Lawrence e João de Patmos.” in Crítica e Clínica / Gilles Deleuze; tradução de Peter

pál Pelbart. – São Paulo: Ed. 34, 1997, p. 60-61)

 

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potlatch (2) festa: dar larvas de idéias e pensamentos, para possíveis co-laborações, devires-monstros. No dia 17 de agosto de 2011, na Unicamp, Campinas, São Paulo, Brasil, durante o III Seminário Conexões: Deleuze e Arte e Ciência e Acontecimento e...
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